sábado, 2 de maio de 2009

Silêncio no Olhar

Relativamente a toda esta questão da Lei do Silêncio e do Olhar, e em resposta ao artigo editorial Não podemos também coibir as Manifestações Culturais sob a alegação de Poluição Sonora!" postado no Blog do Crato, gostaríamos apenas de esclarecer o seguinte junto de todos os interessados e amigos da casa, na esperança de por uma pedra sobre este assunto:

Desde que abriu em agosto do ano passado e até a noite de sexta-feira 13 de março, o Olhar Casa das Artes só havia recebido duas reclamações devido ao volume de som. Os dois casos aconteceram ao longo das duas semanas que antecederam a noite de sexta-feira 13 de março. No primeiro caso, o segurança do Olhar ouviu a chamada sendo feita por um indivíduo a quem tinha sido recusada entrada minutos antes. No segundo caso, dois membros da Polícia Militar visitaram a casa após receberem uma chamada e constataram que o volume de som se encontrava num nível perfeitamente aceitável. Por estes motivos, realmente não tomamos providências especiais relativamente aos níveis de som.

Na noite de sexta-feira 13 de março, no decorrer da apresentação da banda Katingueira (que se apresentou recentemente no evento cultural Abriu p'rá Juventude), recebemos uma terceira visita pela Polícia Militar, que havia recebido nova reclamação e interrompeu a apresentação da banda após inspecionar o nosso alvará e alegar que este não contemplava a realização desse tipo de eventos, mas apenas o uso de som mecânico. No dia seguinte, cancelamos todos os espetáculos de música ao vivo, conforme anunciamos no nosso blog e por email na terça-feira 17 de março, e até resolvermos a questão do alvará.

Desde a noite de 13 de março até a noite de 18 de abril, um período de mais de 30 dias, o Olhar Casa das Artes realizou apenas um evento musical com som mecânico mais alto. Após recebermos um abaixo-assinado na quarta-feira 18 de março, fizemos um pedido público de desculpas e iniciamos o diálogo com a autora do abaixo-assinado, uma vizinha próxima da casa. Em visita ao Olhar, a autora explicou sobre os transtornos causados pela regularidade de eventos musicais, em particular com bandas e durante a semana, mas se mostrou aberta à nossa proposta de realizarmos apenas um ou dois eventos por mês, com som mais alto e em noites de sábado, porque – segundo a mesma - “no domingo ninguém trabalhava e todo o mundo podia descansar”. Pedimos a sua colaboração e deixamos os nossos contatos telefônicos, para que nos ligasse caso se sentisse incomodada com o volume de som.

Desde a noite de 13 de março até a noite de 18 de abril, o único evento musical que realizamos com um nível de som (mecânico) mais alto que o normal, que estava já agendado fazia várias semanas e que - até certo ponto - lamentamos hoje não ter cancelado, aconteceu na noite de sábado 4 de Abril, com um apoio da Secretaria de Cultura, Esporte e Juventude e a participação do Corpo Militar de Bombeiros e com o objetivo de conscientizar sobre o uso de drogas. Para além do acordo com a autora do abaixo-assinado, das parcerias estabelecidas e do objetivo social do evento, outro motivo para não o cancelarmos foi ainda uma tentativa de defender a honra e idoneidade da casa, devido aos falsos boatos e denúncias anônimas e difamatórias que circulavam na cidade, sobre o Olhar ser um lugar onde o uso de drogas era liberado.

Decidimos realizar este evento porque acreditamos que o problema maior era a ‘regularidade’ de eventos musicais, porque o acordo feito verbalmente com a autora do abaixo-assinado permitia a realização de um ou dois eventos por mês com som mais alto, porque a mesma havia se disponibilizado para colaborar e ligar no caso de se sentir incomodada e porque sentimos que os objetivos do evento eram importantes, tanto para nós como para toda uma cidade com um terrível problema de consumo de drogas. Na tarde anterior ao evento, um vizinho manifestou-se contra a sua realização, mas aí sentimos que era tarde demais para cancelar o mesmo, devido a todos os compromissos, e comunicamos que faríamos todos os possíveis para evitar maiores transtornos. Nessa noite, e apesar dos nossos pedidos de colaboração, não recebemos quaisquer chamadas telefônicas pela autora do abaixo-assinado, que preferiu antes ligar para a proprietária do imóvel que alugamos para expor as suas queixas (como descobrimos vários dias depois), nem reclamações de outros vizinhos ou visitas pela Polícia Militar ou pelo SEMACE. Desde essa noite e até a noite de 18 de abril, o Olhar teve apenas música ambiente, não realizando quaisquer outros eventos musicais com som mais alto.

Na manhã de quinta-feira 16 de abril, funcionários do SEMACE visitaram o Olhar, fizeram uma inspeção técnica e – segundo o Auto N.° 1278/2009 – constataram que o estabelecimento “está emitindo poluição sonora”, quando no momento da inspeção nem nos encontrávamos em funcionamento. Na noite de sexta-feira 17 de abril, uma funcionária do SEMACE visitou a casa e realizou uma medição, constatando que o nível de som se encontrava dentro dos limites permitidos. Na noite de sábado 18 de abril, por volta das 22h30, o Olhar recebeu uma visita por cerca de 30 policiais armados e funcionários do SEMACE, quando um artista cantava músicas românticas de sua autoria, acompanhado de som mecânico, com o volume um pouco acima do que se diria ser música ambiente, mas que não sentimos tão alto para uma noite de sábado. Ao contrário do que foi escrito no artigo editorial do Blog do Crato, não houve pânico na casa, apenas alguma indignação pelo que se considerou ser um excesso de uso de força policial. Após interromperem a apresentação sem realizarem qualquer medição dos níveis de som e passarem revista às cerca de 30-40 pessoas que se encontravam na casa (um número ligeiramente acima do número de policiais usados nesta intervenção) sem encontrarem as drogas ou armas que procuravam, funcionários do SEMACE comunicaram que o Olhar estava proibido de usar qualquer tipo de equipamento sonoro. “Nem radinho de pilha”, conforme viemos a confirmar no termo de audiência firmado no dia 20 de abril. Não querendo alegar que nunca ultrapassamos os níveis permitidos, fato é que - até a data de hoje - o SEMACE não realizou uma única medida na casa que ultrapassasse os níveis permitidos, mas foram várias as ocasiões em que fomos visitados ou pela Policia Militar ou pelo SEMACE e o volume de som foi considerado dentro de limites aceitáveis.

Assim, desejamos apenas deixar mais claro que o Olhar não quer (nem quis) manter o volume sonoro. Pouco tempo depois de recebermos as primeiras reclamações, tomamos diversas medidas para reduzir drasticamente o número de eventos musicais e o volume de som emitido pela casa. Desde o momento que recebemos o abaixo-assinado, fizemos esforços para dialogar com os nossos vizinhos, evitar transtornos e para colaborar com as autoridades. Se todos estes esforços foram ou não suficientes, naturalmente e infelizmente nos parece que não, ou não estaríamos hoje sofrendo as duras penalizações impostas por um processo administrativo. Impossibilitados de oferecer sequer música ambiente, ficamos sem outra alternativa senão fechar o bar-restaurante por período indeterminado e dispensar cinco funcionários. Ainda assim, agindo com boa-fé, tentamos. Por tudo isto, e apesar de estarmos cientes que eram nossas as responsabilidades, lamentamos o fato de os nossos esforços não terem sido minimamente reconhecidos pelas autoridades e de não ter havido qualquer esforço de colaboração.

Quanto ao futuro, só Deus sabe, mas - neste momento - não estamos certos nem quanto à viabilidade econômica ou legal nem quanto à nossa vontade de reabrirmos ou realizarmos novos eventos que envolvam equipamentos sonoros, como os eventos em que se apresentaram Correinha, João do Crato com Manel D’Jardim, Auci Ventura, João Nicodemos, a Academia de Cordelistas do Crato e, talvez mais importante que estes nomes reconhecidos, todos os desconhecidos que tiveram aqui a oportunidade de se apresentarem, mostrarem os seus dons e crescerem como artistas e seres humanos.

Queremos paz e estamos olhando para outros projetos artísticos. O Olhar sempre foi e continua sendo mais do que um bar.

Um abraço a todos os amigos da casa e muito obrigado pelas mensagens de apoio.
Equipe do Olhar


p.s. Para bem de todos, esperamos que tudo o que aqui se passou sirva de aprendizado a todas as partes envolvidas, começando por nós...

Um comentário:

Anônimo disse...

Eu mais do que ninguém sei o quanto você batalhou pra chegar at´aqui... você merece o "olhar" das estrelas e ter todo o espaço que é de todos para que nós, junto de você possamos brilhar também...
Aguardo ansiosa as portas se abrirem novamente e como todo cidadão poder ter a liberdade de expressar a arte em todas as suas formas. Estou contigo! Conte sempre comigo. Grande beijo!